segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Morre o transformador do carnaval carioca


Joãosinho morreu às 9h55m de sábado. Ele estava internado em estado grave e respirava com ajuda de aparelhos no Hospital UDI, em São Luís, no Maranhão. O hospital informou que as causas da morte foram choque séptico secundário, pneumonia e infecção urinária.

Logo após a morte do carnavalesco, amigos e admiradores lamentaram a perda. O governador do Rio, Sérgio Cabral, que já havia decretado neste sábado luto oficial de três dias pelo falecimento do ator e diretor Sérgio Britto, decretou mais três dias de luto oficial no estado pela morte de Joãosinho Trinta.

Vida e obra de um gênio da avenida

Quando desembarcou sozinho no cais do porto do Rio de Janeiro em 1951, o maranhense João Clemente Jorge Trinta nem imaginava que mudaria definitivamente a cara do carnaval carioca e se tornaria o mais festejado e criativo carnavalesco de escolas de samba. Então com 17 anos, queria ser bailarino clássico.

Nascido em 23 de novembro de 1933, em São Luís, filho de operários, ele chegou a passar fome até conseguir ingressar no corpo de baile do Teatro Municipal. Como tinha interesse por quase tudo na montagem de um espetáculo, acumulou funções de bailarino, figurinista e cenógrafo.

A entrada para o samba foi em 1963, quando Joãosinho abandonou as sapatilhas, levado para o Salgueiro pelo carnavalesco Arlindo Rodrigues. Foi aí que começou sua paixão pelo carnaval. Dez anos depois, quando seu padrinho deixou a escola, ele assumiu a função de carnavalesco. Em 1974, ganhava seu primeiro título, com o enredo "O rei da França na Ilha da Assombração". No ano seguinte, tornou-se bicampeão com "As minas do rei Salomão".

Mas foi na Beija-Flor, a partir de 1976, que Joãosinho Trinta consagrou-se como mago dos desfiles, revolucionando o carnaval com carros alegóricos imensos e fantasias luxuosas. Foram três títulos seguidos - "Sonhar com rei dá leão" (76), "Vovó e o rei da Saturnália na corte egipciana" (77) e "A criação do mundo na tradição nagô" (78).

Na azul-e-branco de Nilópolis, ganhou ainda os carnavais de 80, com o enredo "O sol da meia-noite - uma viagem ao país das maravilhas", empatado com Imperatriz e Portela, e de 83, com "A grande constelação de estrelas negras".


Conhecido por pregar o luxo nas escolas, ele assombrou o Sambódromo com o desfile dos mendigos e do lixo. "Ratos e Urubus", em 1989, é considerado por especialistas um dos maiores desfiles de todos os tempos, talvez o mais revolucionário. Joãosinho protagonizou uma briga com a Igreja Católica ao levar para a Sapucaí o carro alegórico que trazia um Cristo mendigo e teve que ser coberto com plástico preto. Mas em protesto pela censura, ele colocou uma faixa com os dizeres: "Mesmo proibido, olhai por nós!". Depois de ter cunhado a máxima "Quem gosta de miséria é intelectual, pobre gosta de luxo", o carnavalesco foi ovacionado por ter feito um desfile que expunha a pobreza e o lixo. Por ironia, Joãosinho e a Beija-Flor perderam o carnaval para a certinha Imperatriz, que cantou os cem anos da República. A despeito do lindo samba, pouca coisa restou do desfile da escola de Ramos. Quanto ao de Joãosinho, ainda será lembrado por muitos e muitos anos.

Em 92, seu último ano na azul-e-branco, o carnavalesco foi afastado da direção do projeto que ajudou a criar, o " Flor do Amanhã", que apoiava menores de rua. Foi acusado de corrupção de menores e responsabilizado por abrigar homossexuais e crianças em condições precárias no galpão da entidade. No ano seguinte, magoado, ele afastou-se da folia e viajou para Portugal, onde passou a comandar bailes na casa de espetáculos Cassino de Estoril.

O retorno ao carnaval foi na Viradouro em 94. Mas o primeiro título na escola de Niterói só veio em 97, com o enredo "Trevas! Luz!A explosão do universo!". Foi a volta por cima do carnavalesco. Um ano antes, ele sofrera um AVC que deixou o braço direito paralisado e dificuldades na fala. Segundo o próprio Joãosinho, a doença mudou seu comportamento e sua visão de mundo. Se antes centralizava o trabalho, passou a distribuir tarefas.

Foi Joãosinho também que pôs um homem voando com um minifoguete na Sapucaí em 2001, quando estava na Grande Rio. Os críticos disseram que aquilo nada tinha a ver com samba. Mas Joãosinho era assim mesmo. Irrequieto, inovador, polêmico.

No carnaval de 2004, uma nova polêmica. O enredo "Vamos vestir a camisinha, meu amor...", que contava a história dos preservativos, gerou protestos da Igreja Católica. Três carros com esculturas de bonecos fazendo sexo foram encobertos por recomendação do Ministério Público estadual, que considerou as alegorias ofensivas. A escola ficou apenas em 10º lugar e Joãosinho foi demitido dias depois.

Destaques no alto de carros alegóricos


Que alguns críticos gostem ou não, mas Joãosinho deu o visual que hoje predomina no desfile das escolas de samba. Antes de Joãosinho, os destaques desfilavam no chão, juntamente com os outros foliões e a diferença ficava apenas por conta da roupa, mais luxuosa que as outras. Joãosinho pôs os destaques em cima dos carros alegóricos e aumentou a altura dos carros. O desfile ficou verticalizado. Ele começou a fazer isso no Salgueiro, mas foi na Beija-Flor que o estilo se consagrou.

Embora tenha sido copiada por todas as escolas, sem exceção, a nova estética foi criticada pelas chamadas escolas de raízes. Num samba antológico, o Império Serrano alfinetou em "Bumbum paticumbum prugurundum": Superescolas de samba SA/super alegorias/escondendo gente bamba/que covardia (a crítica tinha endereço certo: a escola de Nilópolis que virou bicho-papão do carnaval).

O luxo de suas fantasias e alegorias não fazia parte do dia a dia de João. Era apenas uma fantasia do menino que deixou o Maranhão para tentar a sorte no Sul Maravilha. Como dizia o refrão do samba de Ratos e Urubus: "Sou na vida um mendigo, na folia eu sou rei".

Fonte: Yahoo

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