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quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Galvão Bueno, o "vendedor de emoções"


No negócio bilionário em que o futebol se transformou, a transmissão de uma partida pela TV ocupa um lugar central. É um evento complexo, tanto do ponto de vista técnico quanto informativo. Meio entretenimento, meio jornalismo, é comandado por um narrador, cuja função é um híbrido de apresentador de telejornal e comandante de programa de auditório.

Como qualquer outro programa, o objetivo de uma transmissão esportiva é alcançar a maior audiência possível. O papel do narrador, neste sentido, é fundamental. Ele é o animador, a quem cabe deixar o espectador ligado em qualquer circunstância, inclusive num jogo muito ruim.

Há vários truques, macetes e formas de fazer isso, mostra o recém-lançado “Grito de Gol: as vozes da emoção na TV” (Editora Leitura, 212 págs., R$ 24,90), no qual o comentarista Bob Faria, do SporTV, entrevista sete conhecidas vozes da televisão.

Não à toa, cabe ao mais importante narrador esportivo da TV brasileira, Galvão Bueno, a percepção mais clara a respeito dos significados deste trabalho. “Costumo dizer que sou um vendedor de emoções.”  E um vendedor, ensina Galvão, não pode mentir, mas deve omitir, sempre que necessário, para convencer o cliente a comprar o seu produto.

“Não adianta eu me esgoelar e dizer ‘que maravilha!!!’ se o jogo não presta. Mas também não posso dizer que o jogo não presta porque não posso convidar o telespectador a desligar a televisão”, explica o narrador.

Em outra passagem da excelente conversa com Bob Faria (foto ao lado), Galvão volta ao tema, depois que o repórter pergunta: “Onde é que você arranja energia para manter o cara ligado duas horas?” Diz o narrador: “No fim das contas, você é um chef de cozinha. Está faltando um pouco mais de pimenta, você vai colocar pimenta; está faltando um pouco de sal, você vai colocar sal; a comida está fria, você dá uma aquecida nela”.

E conclui: “São quase 40 anos fazendo isso e você vai sabendo identificar e criar… Você tem que criar sempre um motivo para o cara não ir embora. Para o cara não mudar de canal e ir embora”.

Milton Leite, do SporTV, diz algo parecido: “Óbvio que é um trabalho jornalístico que a gente está fazendo, mas é muito mais entretenimento nessa coisa de conquistar as pessoas para que elas fiquem assistindo o jogo”.

Bob Faria vê uma transmissão de futebol pela TV como uma construção dramática, como um filme ou uma peça de teatro, e entende que o narrador, de certa forma, é o diretor de cena.

Cleber Machado também enxerga o seu trabalho assim. “O futebol, esporte, não é isso, um roteiro? Você não pode partir do princípio de que alguém é bandido ou mocinho numa competição esportiva, mas você tem os opostos, você tem os caras que estão em conflito, em disputa”, diz, reforçando a ideia de que a simples disputa pela bola em campo não é suficiente: o narrador precisa vender emoções para conquistar o espectador.

O livro traz ainda entrevistas com Jota Júnior, Luis Roberto, Rogério Corrêa e Silvio Luiz – este último é o único que não trabalha para a Globo/SporTV, uma grave limitação do trabalho. Em todo caso, para quem se interessa pela profissão de narrador ou tem curiosidade por ela, “Grito de Gol” é uma contribuição importante.

Fonte: Mauricio Stycer, do UOL

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