O ano de 2012 foi de altos e baixos para a
nossa Teledramaturgia. A Globo, por exemplo, foi ao céu e logo em seguida
desceu ao inferno. Os dois maiores sucessos de repercussão da década (as
novelas “Avenida Brasil” e “Cheias de Charme“) foram substituídos pela maior
queda em audiência da história. Mais uma prova de que apenas boas produções com
algum diferencial prendem o telespectador atualmente. O público hoje tem mais
opções que antigamente e cansou do mais do mesmo na TV.
“A Vida
da Gente”
- Com uma trama feminina por excelência, Lícia Manzo mostrou competência em sua
primeira novela solo, apresentando um texto realista e sensível poucas vezes
visto em nossa teledramaturgia. Com o horário das seis em pleno Horário de
Verão, a novela enfrentou a baixa audiência do início ao fim, apesar da boa aceitação
do público. Talvez uma explicação estivesse no excesso de drama, presente em
todos os núcleos, em detrimento ao humor.
“Fina
Estampa”
- Um sucesso popular que alavancou a audiência do horário nobre da Globo, a
trama de Aguinaldo Silva foi a novela de maior ibope dos últimos cinco anos. O
autor uniu tramas surreais – entende-se sem compromisso algum com a realidade –
com personagens caricatos – como a vilã Tereza Cristina (Christiane Torloni) e
o gay Crodoaldo Valério (Marcelo Serrado) -, e uma heroína maniqueísta –
Griselda (Lília Cabral), mulher batalhadora, mãe sofrida, boa e justa,
concebida para criar empatia com o público que se identifica com essa figura
idealizada. A aposta no tom farsesco e na comédia popular funcionou. Apesar do
espaço que a vilã Tereza Cristina ganhou em detrimento à protagonista Griselda,
foi o coadjuvante Crô que teve mais notoriedade. E acabou pulando da telinha
para a telona do cinema.
“Aquele
Beijo”
- Miguel Falabella apresentou uma trama de humor espirituoso e inteligente,
típica de seu universo. Mas faltou à novela uma história central empolgante.
Foram as tramas paralelas, recheadas de bons personagens secundários, que
fizeram a novela. A audiência, aquém da esperada, ficou à altura da história
morna apresentada.
“Malhação” - Em agosto de 2011,
a Globo estreou com grande alarde “Malhação Conectados”. Trouxe Ingrid
Zavarezzi da TV a cabo para roteirizar a nova fase de sua tradicional novela
teen, e a lançou prometendo tramas sobrenaturais repletas de mistério e suspense.
Mas de nada adiantou. À medida que a audiência foi caindo, os temas paranormais
foram sumindo da história. Novos roteiristas entraram para auxiliar Zavarezzi.
As tramas de suspense saíram, o romance ganhou mais destaque, mas o ibope
continuou baixo. Em agosto de 2012, “Malhação” estreou sua atual fase, que
mantem a tradição do programa, retratando o dia-a-dia de colegiais, seus
namoricos e problemas pessoais e familiares dentro e fora da escola. Com uma
cara mais moderna e foco maior em adolescentes, a novelinha enfrenta a baixa
audiência atual que assola a TV aberta.
“Vidas
em Jogo”
- A autora Cristianne Fridman soube despertar a atenção do público promovendo
reviravoltas e pontuando a novela com momentos chave durante os longos onze
meses em que a trama esteve no ar. Assassinatos em série, personagens com HIV e
viciados em crack e até uma transexual foram o chamariz para despertar a
curiosidade do público, que respondeu à altura e manteve a audiência do horário
para a Record.
“Rebelde” - A primeira temporada
da novela teen terminou em março de 2012 dando lugar à segunda temporada, que
desgastou a grife e fez despencar a audiência. Prejudicada pelas constantes
mudanças de horário, a trama apelou para a “vampiromania” e RPG sem sucesso. A
crise maior instaurou-se com a estreia de “Carrossel” no SBT, que lhe tomou o
posto de segunda colocada na audiência. A autora Margareth Boury acabou
deixando a novela antes de seu término. “Rebelde” teve seu fim precipitado e
terminou melancolicamente, com brigas e revolta nos bastidores. Apesar dos
percalços, é inegável a repercussão junto aos fãs nas mídias sociais e nos
shows da banda formada pelos atores da novela.
“Corações Feridos” - Os 100 capítulos
da novela de Íris Abravanel foram gravados entre março e agosto de 2010. Sua
estreia foi sendo protelada, até que finalmente o SBT decidiu desengavetá-la.
Puro folhetim, com todos os clichês possíveis do gênero, esta produção do SBT
manteve o ranço melodramático da novela xicana original na qual foi inspirada –
apesar de elementos nacionais incorporados à trama, como a trilha sonora e
ambientações.
“Amor
Eterno Amor”
- Elizabeth Jhin apresentou uma trama folhetinesca diluída em um discurso
filosófico e doutrinário com temas espiritualistas. Mas, ao impor uma doutrina
em detrimento à história romântica, exagerou na dose religiosa, o que levou ao
didatismo monótono. A trama ainda se arrastou por meses e a autora só apressou
sua história no final. Os maiores destaques foram os vilões vividos por Cássio
Kis Magro e Osmar Prado – Melissa e Virgílio.
“Avenida
Brasil” - Um
verdadeiro fenômeno de repercussão, a novela de João Emanoel Carneiro virou
coqueluche na Internet , provando que a telenovela pode se aliar à rede, e não
encará-la como uma concorrente. A “nova classe C” retratada na trama cativou
todas as classes. Como em um jogo de certo ou errado, o autor brincou com as
nuances simbólicas de ricos e pobres, elaborando uma crítica social muito
pertinente. Adriana Esteves se consagrou na interpretação antológica da vilã Carminha,
o melhor papel de sua carreira até então. No elenco, bem dirigido,
destacaram-se também Débora Falabella, Murilo Benício, Marcello Novaes, José de
Abreu, Vera Holtz, e muitos outros. “Avenida Brasil” transgrediu a fórmula do
folhetim clássico ao apresentar uma história de vingança em detrimento à
história de amor, com uma heroína de personalidade dúbia (Nina). A estética
cinematográfica e o ritmo alucinante da trama – sempre com ganchos bombásticos,
o que aproximou a novela dos seriados americanos – cativaram o telespectador e
fidelizaram a audiência. Lamenta-se apenas que tenha perdido o fôlego na
segunda metade para o final em função do horário eleitoral gratuito, que
afastou muitos telespectadores da frente da telinha. O Brasil parou para
assistir ao último capítulo – que chegou a ser noticiado pela imprensa
internacional depois que um comício com a presidente Dilma Rousseff foi adiado
para evitar a concorrência com o final da novela.
“Cheias
de Charme”
- A primeira novela da dupla de autores Filipe Miguez e Izabel Oliveira trouxe
de volta o sucesso ao horário das sete da Globo e teve o mérito de tirar
proveito da Internet, transformando-a numa poderosa aliada: a novela foi
pioneira na ação de transmedia, com o lançamento do clipe das Empreguetes primeiro
na rede, depois na novela. A indústria do entretenimento real misturou-se ao
entretenimento da ficção, com os cantores da novela dividindo o palco com
vários cantores reais. A identidade visual deu o tom que o roteiro exigia. O colorido dos shows de technobrega
inspiraram os cenógrafos, figurinistas e a direção de arte. Cláudia Abreu
brilhou com os figurinos exagerados e a interpretação da desastrosa vilã
Chayene, sempre acompanhada de sua “personal curica” Socorro (a revelação
Titina Medeiros). Apesar de toda a repercussão, registra-se a perda de
agilidade em sua narrativa após o sucesso das Empreguetes como cantoras, a
partir da segunda metade da trama.
“Máscaras” - Problemática
atração da Record, a novela de Lauro César Muniz causou estranhamento logo no
início: uma direção equivocada e um texto por demais confuso afastaram o
telespectador. A emissora viu seu Ibope cair vertiginosamente, o que acabou por
deflagrar a pior crise no setor de Teledramaturgia desde que foi renovado, em
2004. A novela teve seu horário de exibição trocado várias vezes, causou
desconforto entre elenco e o autor (a atriz Luiza Tomé reclamou publicamente da
novela e do autor), e culminou com a troca do diretor e a antecipação de seu
término. Parte do elenco divulgou na Internet uma carta em que culpava a mídia
pela repercussão negativa da novela. Mas o estrago já estava feito.
“Carrossel” - Um dos maiores
êxitos do ano na televisão, a novela adaptada por Íris Abravanel (a partir do
original mexicano) espantou até os dirigentes do SBT, que não esperavam esse
sucesso todo. “Carrossel” tornou-se um fenômeno de audiência para os padrões
atuais da emissora e lhe devolveu o segundo lugar no horário nobre, desbancando
a Record. Novela com público fiel e certo – o infantil -, sua repercussão
reflete a carência deste tipo de programação no horário nobre da TV aberta
brasileira. A novela conseguiu atrair o público que estava nos canais pagos ou
até mesmo longe da televisão.
“Gabriela” - A nova adaptação para o romance de
Jorge Amado – feita por Walcyr Carrasco – não marcou a história da TV como a
primeira versão, de 1975, mas manteve uma boa audiência no horário das onze da
noite. Elenco e direção competentes numa produção requintada, desde a abertura
até cenários, figurinos, fotografia e a trilha sonora saudosista, que trouxe de
volta algumas das músicas da novela da década de 1970. Os bordões “Vou lhe
usar” (do Coronel Jesuíno/José Wilker) e “Jesus Maria José!” (de Dona
Dorotéia/Laura Cardoso) se popularizaram e viraram memes na Internet. José
Wilker e Laura Cardoso foram os grandes destaques no elenco.
“Lado a
Lado”
- A novela das seis – de autoria dos novatos João Ximenes Braga e Cláudia Lage
– é a melhor atualmente no ar, mas amarga uma baixa audiência desde sua
estreia, prejudicada pelo Horário Político e Horário de Verão. Uma trama de
época com nuances históricas narrada sem grandes arroubos, retratando um
período poucas vezes visto na teledramaturgia. A produção requintada e o elenco
afiado parecem pouco para despertar a atenção do telespectador.
“Guerra
dos Sexos”
- Este remake da famosa novela de Silvio de Abreu da década de 1980 também
sofre na audiência. Se não deslanchou depois de três meses no ar, dificilmente
conseguirá. Aos olhos de hoje, a luta das mulheres pela conquista de um espaço
na sociedade dominada por homens soa anacrônica. O autor até tirou o foco da
disputa entre machistas e feministas, mas a direção optou por uma linha de
humor mais ingênuo, que, no ar, soa bobinho demais. Na verdade, “Guerra dos
Sexos” mostrou-se ser uma escolha equivocada para um remake.
“Balacobaco” - A Record antecipou
o fim de “Máscaras” e colocou às pressas no ar essa história de Gisele Joras.
Mas de nada adiantou. Nem o tom excessivamente popularesco da trama tem chamado
a atenção do público. A novela tem uma pegada de comédia, é colorida, repleta
de personagens caricatos e tem uma trilha sonora popularíssima. Une elementos
de novelas das sete horas da Globo com trilha semelhante à de “Avenida Brasil”.
Mas faltam personagens e histórias cativantes. Se “Máscaras” ficou marcada pela
repercussão negativa, “Balacobaco”, com uma audiência ainda menor, nem sequer
repercute.
“Salve
Jorge”
- Com a menor média de audiência da história até o momento, a novela de Glória
Perez tem enfrentado a rejeição do público e críticas por toda parte, seja pela
repetição de temas e elenco, pelo número excessivo de personagens, ou pelas
dancinhas e bordões estrangeiros que já não despertam mais tanto interesse como
na época de “O Clone”. E a sensação de déjà vu é tão grande que a Turquia da
novela parece uma mistura de Marrocos com a Índia.
Mas o inimigo maior de “Salve Jorge” é a
novela anterior, “Avenida Brasil”, que acostumou mal o telespectador com uma
trama ágil, deixou muitos “viúvos apaixonados” e tem uma grande diferença com a
trama de Glória Perez: narrativa e esteticamente falando. O sabor de novidade
de “Avenida Brasil” foi substituído por uma novela conservadora e já conhecida
do público. Apesar de o tráfico humano abordado na trama ser uma novidade bem
vinda.
Fonte: Nilson Xavier, do UOL
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