terça-feira, 13 de setembro de 2016

"Justiça" é destaque de 2016 na TV



Fãs de séries de qualidade, disponíveis na TV paga ou em serviços de streaming, certamente têm muitas restrições a fazer a “Justiça”. Mas é preciso avaliar a minissérie dentro do meio em que está sendo apresentada – o da TV aberta brasileira. Neste contexto, exibidos os oito primeiros episódios, de um total de 20, é possível afirmar que se trata de um dos grandes acontecimentos de 2016.

É verdade que o texto de Manuela Dias é excessivamente didático e, por vezes, subestima o espectador ao “desenhar” alguns dramas. Para falar de racismo, mostrou que o único preso em uma blitz policial foi a jovem negra. Buscando enfatizar o desejo de vingança da professora de direito, exibiu a personagem armada na porta do presídio, mirando no assassino de sua filha.

Também chama a atenção a vontade de chocar o espectador a qualquer preço, sem que haja sustentação da história. É um encadeamento de drama atrás de drama de forma quase gratuita – uma receita que também fez o sucesso da novela “Verdades Secretas”.

Falo, por exemplo, da cena em que o menino que não encontrava a mãe havia sete anos a assaltou, sem saber quem era. Ou da tentativa de suicídio da jovem que sofreu bullying virtual – uma situação complexa que, do início ao fim, consumiu apenas alguns poucos minutos da minissérie.



Mas, como disse, apesar de enxergar estes problemas, considero “Justiça” um programa muito acima da média. Em primeiro lugar, pela ambição “cinematográfica” da minissérie. O diretor Jose Luiz Villamarim tem oferecido um verdadeiro show visual.

O cuidado com a encenação se estende aos mais variados detalhes – da fotografia à trilha sonora, passando pela edição e direção dos atores.

Longos planos sem cortes provocam o espectador habituado a uma linguagem visual mais simples. A câmera nunca está no lugar mais fácil e esperado. Recife é uma personagem importante da história e, como tal, é tratada, respeitando as suas diferentes “camadas”.

O formato – quatro histórias independentes, mas interligadas por alguns personagens – repete um modelo já bastante visto em outras mídias. Não é nenhuma novidade. Mas não deixa de ser corajoso apresentar uma produção assim em um meio que quase sempre prefere o mais fácil e o óbvio.

 


Há uma nítida entrega dos atores, boa parte deles vivendo papéis que os tiram de situações confortáveis – são notáveis os desempenhos de Débora Bloch e Adriana Esteves, para citar apenas dois exemplos.

Alguns temas, igualmente, fogem do óbvio e provocam o público. Talvez o mais ousado seja a intrigante relação da faxineira Fátima (Adriana Esteves) com o policial Douglas (Enrique Diaz), responsável pela ruína de sua família. Outro personagem interessante é Celso (Vladimir Brichta), que transita em todas as quatro histórias – ele é traficante de drogas, sócio de um prostíbulo, meio malandro, meio covarde.

A amizade de Débora (Luisa Arraes) com Rose (Jéssica Ellen), filha da empregada, não é um tema novo, mas está sendo apresentado de maneira complexa. A história de Antenor (Antonio Calloni), o empresário sem escrúpulos que resolve se aventurar pela política, é outro tema familiar, mas cuja atualidade justifica a sua inclusão na história.

Os dois primeiros episódios de “Justiça” estão entre os grandes momentos que vi na televisão em 2016. A minissérie não manteve a mesma qualidade na sequência, mas ainda assim, pensando na teledramaturgia exibida este ano pela Globo e suas concorrentes, está muito, mas muito mesmo, acima da média.

Fonte: UOL

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