segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Beatriz Segall volta à TV e ao teatro


Falta pouco, muito pouco. Enfim, ela vai voltar. E, para os amantes da (tele)dramaturgia brasileira, este é um dos mais aguardados retornos de todos os tempos.

Falou em Beatriz Segall, pensou em quem? Pois na próxima quarta-feira a atriz ressurge na pele de uma das grandes, senão a maior vilã da história da TV nacional: Odete Roitman. Na reprise de “Vale tudo”, no Canal Viva, a personagem chega ao Brasil, após uma temporada em Paris, para começar a aprontar das suas. Os fãs da trama de Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, imenso sucesso em 1988/1989, fazem novamente a novela bater recordes de audiência, agora na TV por assinatura.

E tem mais: no dia seguinte, a veterana atriz - hoje aos 84 anos de idade, 59 de carreira - pisa no palco do Centro Cultural Correios, no Centro, na estreia da peça “Conversando com mamãe”. Um texto delicado e emocionante, em que divide a cena com Herson Capri, de 59 anos, 35 de profissão. Na conversa com a Canal Extra, a grande atriz relembra grandes momentos. Viva!

Como é sua personagem em “Conversando com mamãe”?
A peça é muito simples e, ao mesmo tempo, muito emocionante e engraçada. Minha personagem chama-se Mamãe. É uma mulher simples, mas extremamente esperta e corajosa. Ela faz da velhice uma espécie de vantagem, pela sabedoria que adquiriu. É uma mãe protetora, que ama o filho e vive discutindo com ele.

Alguma semelhança com a Beatriz Segall mãe?
Ela é igual a todas as mães, entende? Igual a mim, principalmente, porque ela é inteligente, simpática e boa (risos). Olha, tenho três filhos e dez netos. Minha relação com a família é muito boa, muito transparente. Já avisei logo no primeiro neto que nasceu que eu não iria trocar fraldas de bebê. Isso eu fiz muito com os filhos, e me deu muito trabalho cuidar deles. Mas meus netos são ótimos... O mais velho tem 24 e a mais novinha, 6 meses. Estou é esperando que meus filhos venham aqui ouvir algumas coisinhas da peça que vão servir pra eles...



A personagem tem 82 anos, dois a menos que você. Como lida com essa questão do envelhecimento?
Ah, muito bem. Envelhecer, para mim, não é um grande problema, não. Eu nunca dizia a minha idade, porque acho que uma atriz não pode dizer. Se o público sabe quantos anos você tem, mesmo que no palco você possa fazer uma mulher de 35, e tem 50, não vão aceitar. Agora, chega um ponto em que isso também cansa. Quando fiz 80 anos, fiquei tão feliz que resolvi abrir.

Como lida com o assédio do público?
Isso vai diminuindo com o tempo. As pessoas já não ficam com aquelas correrias bobas para pedir autógrafo. Acontece, claro, mas nada que incomode. Dificilmente tem alguém que seja desagradável, mas há casos como outro dia, na Rua Augusta, em São Paulo, em que de repente uma fulana surgiu na minha frente, tirou os meus óculos escuros e disse: “Ah, deixa eu ver seus olhos!”. Uma coisa tão assustadora! As pessoas pensam o quê? Que você é de cera? Então, já amarro a cara na rua.

Em 2010, se comemoram os 60 anos de TV no Brasil. Sente-se parte importante dessa história?
Olha, eu me considero vitoriosa, satisfeita. Acho que fiz muito mais do que eu mesma esperava. Eu fiz papeis importantíssimos, do ponto de vista de qualidade do trabalho, qualidade da produção e do texto, sobretudo. Um bom texto é o principal.

Você costuma assistir à televisão?
Gosto, mas já gostei mais da TV... Os trabalhos eram muito mais consistentes, mais bem feitos. A televisão brasileira caiu muito, infelizmente. Hoje, não me agradam os textos, a falta de consistência no que é tratado, o excesso de violência e de sexo. Não que não deva ter, sexo é uma coisa muito bonita, mas tem que ser mostrado como uma coisa bonita e prazerosa.

Seu afastamento da TV foi voluntário (sua última participação em novelas foi em “Bicho do mato”, da Record, em 2006)?
Foi falta de oportunidade e também porque, como eu abro a boca e falo tudo o que penso, tem gente que não acha muito agradável.

Gostaria de ser convidada para mais um papel na TV, ou está feliz só no teatro?
Não sei... Vamos ver o que é que vem.

E as vilãs, que tanto marcaram a sua carreira?
Eu acho que agora até o público está cansado disso. As pessoas precisam ver que eu não sou atriz de um papel só. Qualquer novela que vou fazer, sempre me botam em situações em que eu sou a má, e eu fico driblando, tentando mudar um pouco as coisas. Mas não adianta, e isso me irrita um pouco. Gostaria de testar novas possibilidades.

É verdade que as pessoas se incomodam quando você não interpreta papéis sofisticados?
Na época de “Champagne” (1983, em que ela era a suburbana Eunice), falavam: “Não gostei de ver você feia, de lenço na cabeça, na boca do forno”. Bobagem! Tenho costumes simples no meu dia a dia. Ninguém consegue ser a rainha da Inglaterra o tempo todo, só a própria. Eu durmo muito, acordo tarde, como em horas desordenadas, gosto de cozinhar, vou muito ao cinema, vou ao teatro, viajo... Não há grandes coisas na minha vida, muito diferente da dos outros, não.


 “Beatriz Segall detesta falar sobre Odete Roitman”. Verdade ou mito?
Não é que eu não goste. É que eu cansei... É como se eu só tivesse feito esse papel na vida. Só que eu fiz papéis mais importantes no teatro. E é sempre a mesma pergunta. As pessoas acham que estão sendo extremamente originais quando passam e perguntam: “Quem matou Odete Roitman?” (faz voz de deboche). E são mais de 20 anos assim...

Mas existe um carinho por ela, não?
Ah, claro! Por isso ela ficou essa vilã marcada para sempre. Nunca fui agredida nas ruas por causa da Odete. Ela era admirada, entende? Porque era rica, poderosa, bem-vestida, bonita... E isso atrai, dá vontade de ser igual. Na época, me sugeriram até para me candidatar a vereadora! Ué, o Tiririca não foi eleito? Eu podia ter sido também!

E agora, com a volta de “Vale tudo”, essa memória fica mais forte do que nunca. Preparada?
Sabe, ouço essas brincadeiras chatas todo o tempo, nunca deixei de ouvir. Quando entro numa loja, é muito comum dizerem: “Ô, dona Odete, que bom receber a senhora!”. Essa perda de identidade não é o que mais me incomoda, mas as pessoas acharem que eu só fiz aquilo. Isso é chato.

Tem assistido à reprise da novela?
Não, é muito tarde... Ou eu estou ensaiando ou dormindo, não dá. Quando Odete entrar, quem sabe eu não me interesse mais? Acho muito bom que vá ao ar de novo, eu já dizia isso há muito tempo. Deviam reprisar, sim, mas em horário nobre. Agora já são três ou quatro gerações que não viram a novela, e ficam perguntando como era Odete, por quê sempre se falou tanto nela. A novela estar sendo um sucesso na madrugada me deixa feliz, mas poderia passar num horário melhor. Vou, sim, ficar curiosa para me assistir.

Qual lembrança mais forte tem daquela época?
Foi um tempo de muitas alegrias. O elenco era maravilhoso, extremamente agradável. Todo mundo estava contente com suas possibilidades na novela, e isso fazia bem para a obra em si. Trabalhar com Nathália Timberg, Renata Sorrah, Fagundes... excelente!


Acha que é a responsável pela valorização do papel de vilão junto aos atores?
Acho! Até então, ninguém queria ser o malvado da história. Odete era durona, sabia o que queria, comprava as pessoas, e não fazia questão nenhuma de ser simpática. Mas ela era muito engraçada! As barbaridades que ela dizia do Brasil... No fundo, todo mundo achava que ela tinha razão.

 “Vale tudo” teve uma importância muito grande na teledramaturgia e até na história política do país...
Ah, sim. Muitos artigos eram escritos citando a “dita cuja”.

Acredita que Odete Roitman tenha sido o grande presente de sua carreira?
De certa forma, sim. Não passei em brancas nuvens na televisão. Eu já tinha feito “Água viva” (1980), que foi muito bom pra mim, mas fazer a Odete... Não posso dizer que tenha sido má sorte. E isso se desdobrou para os telespectadores. Tem uma história bonitinha: eu vinha saindo do Teatro Municipal uma noite, e um taxista fez de tudo para eu entrar no carro dele. “A senhora tinha que entrar no meu carro, preciso lhe contar uma história!”, disse ele. E eu: “Então conte!”. “Sabe, quando a Odete Roitman morreu, todo mundo fixou o número do túmulo dela. E foi um tal de jogar no bicho para abocanhar parte da fortuna da Odete! Joguei uma vez, mas não ganhei nada. E falei pra minha mulher que eu ia esperar um pouco e jogar de novo. E não é que deu certo? Eu joguei, ganhei, aproveitei para dar um conforto a mais pra minha família, comprei esse carro e fiquei muito feliz. Eu estava louco para lhe encontrar um dia e contar isso!”. E eu ria, porque ele achava que eu é que tinha feito isso por ele. Achei tão bonitinho.

Qual a sua opinião sobre os novos famosos alçados pela televisão?
O que é celebridade hoje em dia, eu pergunto? Uma garota que está começando, aparece de biquíni e já é celebridade. É só ser um pouquinho conhecido. Celebridade não significa mais nada, não tem nada de verdadeiro. Na minha época, ser célebre era ser especial. Hoje, não mais. O problema é que as meninotas bonitinhas tomaram conta, e quem tem mais de 65 anos não tem valor na TV. Os mais velhos já morreram para a televisão. Coisa que não acontece no teatro. Teatro é teatro, é a minha profissão. Ele dá oportunidades que a TV não dá. Por isso comecei nele e vou terminar nele.

Fonte Jornal Extra

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