sexta-feira, 23 de julho de 2010

Aguinaldo Silva não acredita em grandes audiências


Aguinaldo Silva começou a sua carreira de escritor ainda na adolescência, quando publicou seu primeiro romance. Em pouco tempo, ingressou no jornalismo, como repórter de polícia. Mas sua maior contribuição às letras deu-se, indiscutivelmente, na tv. Como autor de novelas, participou de alguns dos maiores sucessos do gênero, como “Roque Santeiro”, “Tieta” e “Senhora do Destino”. Aos 66 anos, recém-completados em junho passado, o autor mostra que está em plena forma. Além de continuar a escrever teledramaturgia, encontra disposição para passar a sua experiência de mais de 30 anos no ramo aos jovens roteiristas que participaram das duas master classes promovidas pelo autor, a última delas concluída em maio deste ano. No momento, Aguinaldo Silva está em Portugal, de onde concedeu a entrevista a seguir, por e-mail, na qual fala de ibope e da carreira de autor de novelas.

Jornal da Mídia - Como surgiu a idéia do Master Class?
Aguinaldo Silva - Eu já tinha feito uma primeira Master Class em Lisboa. Para mim foi uma experiência muito interessante trabalhar em outro país, com roteiristas que têm uma visão menos "exuberante", digamos assim, da profissão. No Brasil, durante um jantar com Jackeline Barroso e Eduardo Pires, no qual eu falava sobre essa experiência, eles perguntaram: "Por que não faz aqui?" Eu topei, e eles organizaram tudo. Fizemos a primeira, fizemos a segunda... E agora é possível que, a partir da terceira, haja uma emissora de tevê (ainda não posso dizer qual) envolvida com o projeto.

JM - Como avalia a experiência com as duas turmas?
AS - A primeira coisa a dizer é que existem grandes roteiristas à solta por aí, sem ter a menor oportunidade de trabalho. Alguns deles participaram destas duas Masters, e eu procurei encaminhá-los de algum modo. Cinco da primeira turma já foram contratados pela Rede Globo para escrever comigo, como colaboradores, a novela "Marido de Aluguel", que foi criada durante o curso e comprada pela emissora.

JM - As novelas das oito estão registrando médias de audiência cada vez menores. A que o senhor atribui isso? Acha que é possível reverter esse quadro e, se sim, como?
AS - Não creio que algum dia se volte às grandes audiências. A última novela a quebrar recordes foi "Senhora do Destino", em 2004, e os números que ela atingiu (50.4 de média geral) estão cada vez mais inatingíveis. Não consigo encontrar uma explicação lógica para essa queda de audiência das novelas, já que os pontos que esta perdeu não foram redirecionados para outros programas. Há quem diga que as audiências continuam as mesmas, o que houve foi uma mudança de metodologia por parte do Ibope, mas não me sinto em condições de afirmar isso.

JM - Escrever telenovelas é um trabalho muito estressante sob vários ângulos. O que o motiva a continuar atuando nesse segmento aos 66 anos?
AS - Eu podia lhe dizer, bancando o arrogante, que o que me motiva é o salário imoral pago aos novelistas do horário nobre. Mas não seria verdade. O que me motiva é que eu adoro escrever, e adoro mais ainda escrever novelas. Ainda tenho muito que aprender nesse meu ofício, e o único meio de aprender é fazendo. Pretendo escrever mais duas novelas antes de me decidir pela aposentadoria. Mas, mesmo aposentado, sempre poderei ter uma recaída e voltar ao trabalho.

JM - Que qualidades deve possuir um bom escritor de teledramaturgia?
AS - A novela tem que obrigatoriamente "iludir" o telespectador, quer dizer, dar a ele a impressão de que o que se passa na novela é a mais pura realidade. Para isso, o seu autor tem que viver no mundo real, antenado em tudo o que se passa. Tem que ter também muita experiência de vida, e é por isso que não existem autores jovens. Tem que ter muito talento, é claro, mas tem que ter, acima de todas as coisas, um senso muito rígido de disciplina, e esta é a qualidade mais difícil de alcançar.

JM - O senhor acredita que possa surgir, a curto ou médio prazo, algum nome tão bom neste ramo como o seu, o de Janete Clair ou de Gilberto Braga?
AS - Não acredito não, justamente pelo que falei anteriormente: os jovens de hoje vivem numa redoma e sabem muito pouco sobre a vida. Por mais talento que tenham, podem no máximo escrever livros de umas cento e poucas páginas em que recriam o não vivido. Mas não têm a menor condição de escrever as 4800 páginas de uma novela.

JM - O senhor já se utilizou bastante do Nordeste dramaturgicamente. O que essa região do País tem de tão especial, a seu ver?
AS - O Nordeste é mágico, porque parece distante aos olhos dos outros brasileiros, mas ao mesmo tempo lhes é assustadoramente próximo. O Nordeste é o território no qual habitam todos os mitos brasileiros, e por isso, mesmo que alguém nunca tenha lá posto os pés, ao vê-lo reproduzido na telinha é capaz de reconhecê-lo.

Fonte: Juliana Brito, da redação do JORNAL DA MÍDIA

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